Na primeira manhã em que abriu a janela para rua, o som intragável de uma música eletrônica fez vibrar seus dois ouvidos. Desde esse dia então pensou que melhor seria ficar trancado até as tripas se dissolverem e saírem por suas orelhas e poros para não ter que escutar aquele som. Um som que devia ficar preso no inferno atormentando as almas pecadoras da Terra. Quando se lembrou da frase de Sartre "o inferno são os outros' riu para si mesmo. O verdadeiro inferno é essa música, concluiu. Pensou em um livro que tinha lido há muitos anos" Os demônios descem do Norte" e era quase profético ao narrar a saga dos evangélicos que vinham da América do Norte e se espalhavam pelo mundo. Eram pensamentos vagos. O Tinhoso devia estar feliz, o capeta e seu tridente em riste. Quis abrir a janela, quis pensar que estava errado, que tinha exagerado em suas percepções. Não pôde. Ao som torturante da música eletrônica, como um marca-passo estúpido e insistente, no meio de tantos que dançavam, havia um ar de triunfo, quase satânico e um sorriso escondido em uns olhos vermelhos. O inferno era agora, finalmente o diabo tinha vencido.
30 comentários:
adriana,
belo texto, meio conto meio canto meio crônica- sobre estas modernidades estranhas e esses barulhos escrotos que teimam em chamar de música. Seu texto tá tão bom que dá vontade de continuar a escrever... faazendo um capítulo II. a manhã seguinte.Abraços- Danilo
um toque de "ginsberg",como diz o Pimenta nessa descrição casual e lírica...tbm não sou fã de música eletrônica...e esse desenho em carvão? que lindeza,Adriana!!!
Danilo, comentário porreta o seu! Obrigada. beijo.
Xará, sempre gentil e perspicaz. Agradeço por mim e pelo Rafa. Bj
Então a trilha sonora do inferno é música eletrônica, Adriana? rs.
Eu AMEI esse desenho!
Bjo pra vc, querida. Boa semana.
Parece vc no desenho...
Nos infernos musicais...
Bela imagem de texto carvão.
bjs e abs
Talita, acho que é...rs. Valeu.
Felipe, é um ponto de vista. Agradeço pelo Rafa e por mim. Bj
adriana,
tomei uma cacetada no final, mas estou melhor agora - rsrss
bj
Como disse em um poema, dia desses, é preciso ter muita coragem pra ser poeta, pra falar de coisas assim, desses lados "Bs", tão indissociáveis de nós, de todos...
é preciso ter coragem e essa voz poética (profética?) sobre coisas, mesmo as mais escondidas no fundo da alma, de toda alma. beijão,
texto violentamente lúcido.
Cynthia
Ah, e... caramba, que desenho é esse?!?!?! lindo!!!!!!!!! seu filho tá arrebentando, hein?!
beijo nos dois,
Cynthia
Vixe, ele vence mesmo. Que engraçado, hoje o vizinho colocou um som altíssimo de um gênero musical que eu detesto. Eita inferno próximo, esse, hehehe...
Grande abraço, Adriana.
O desenho do Rafa está assustador. Queria elogiar só o filho da mãe, está grande o menino. A mãe já ficaria satisfeita, mas tenho que dizer que seu conto/poema enrosca na garganta... "Deus e o Diabo é quem me guia!" - lembra? Ensurdecedor, como se o diabo se fizesse presente, ou Deus ausente.
Um beijo.
Se ele venceu, dancemos no mesmo frnesi com ele.
oi,adriana!...momentos endiabrados... num dia comum ,de qualquer um de nós. ficou interessantíssimo + o retrato "brilhante" ,desse poeta das ilustrações, rafael.
bjo
nos dois
taniamariza
Oi Adriana, texto bem elaborado numa temática existencial intrigante , curiosa, que desperta interesse e reflexão. Muito bom ! Obrigada pelo carinho de sempre.Bj.
Oi Dri,
Sei o que é isso! Em BH, mais precisamente no bairro Ouro Preto perto de Pampulha, eu não dormia com as disputas de sons nos carros.
Devia ser mesmo satã, que faz isso.
Voltando ao texto, sempre maravilhoso and black.
Beijos
Mirse
Tb não gosto nem um pouco de múscia eletrônica. Aqui o que me atormenta são os funks. A molecada ouve no máximo o dia inteiro.
Beijo
mesmo prosaica a poesia café forte da adriana sobreleva-se ao abisso
plim
Buenas, Lara, Cynthia, JC, Tania, Casa, Úrsula,Mirse, Daniel, Bardo...amo seus comentários. A visita de vocês é como dizer: Eu tenho que continuar. Isso é muito estimulante. Obrigada e beijos.
adriana,
não resisti e vou escrever a manhã seguinte: não fique braba- é só uma brincadeira inspirada em seu texto.
abraços meus
danilo- te mando no seu blog.
Danilo, sem problema! Fico até orgulhosa de um texto meu servir de inspiração para o seu. Beleza. Beijo.
Sinto-me muito identificada com ele, não sei se os demônios descem do norte, só sei que estão na tortura dessa música que cheira a estase. O desenho sempre maravilhoso do Rafa acompanha com exatidão o teu texto. Maravilha
Beijos
Estercita
Maravilhoso e adoro essa frase do Sartre.
beijos
que belo texto Adriana! Um desassossego...
(música eletrônica, hummm! sabia que o diabo estava no meio..rs)
Parabéns a ti, está lindíssimo.
hahahahaha!
(pimenta no dos outros é refresco, né?)
sabe, eu não gosto do estilo, mas, pense, poderia ser pior: vc poderia morar na minha casa, cujos vizinhos colocam caixas de som que parecem de boite com a swingueira. tinha até uma postagem sobre isso, lá, rascunhada. mas essa, em parceria com a lavínia. nem ela suporta.. rsrsrs..
o texto, claro, praxe, ótimo :)
um beijo.
wow,drika!
que texto? eu sou uma grande admiradora dos seus contos,e prosa é definitivamente o teu forte: amo!
"Desde esse dia então pensou que melhor seria ficar trancado até as tripas se dissolverem e saírem por suas orelhas e poros para não ter que escutar aquele som. Um som que devia ficar preso no inferno atormentando as almas pecadoras da Terra."
ps: o diabo quer sempre mais ...e ele quer alto: só pra mostrar que pode !(rs)
beijos amore!
Anita.
Marcus, Isabel, Márcia, Daufen, Nina, Anita....obrigadíssima por esses comentários tão originais. Beijos.
Nina, hehehehe!!!
Anita, o diabo sempre quer mais mesmo...
oi, oi!!!
adriana,
você é a pessoa que me impulsiona a voltar sempre ao meu blog.
e quando vejo "voz" atualizado, venho aqui beber das suas palavras.
ando meio sem tempo pra tudo, comecei a escrever a minha monografia...
beijãozão.
adriana,
olha aí o mue delírio sobre a sua primeira manhã... grande abraço, manamineira de prosa boa!
adriana, tá aqui-
“O inferno era agora, finalmente o diabo tinha vencido. O inferno era agora, finalmente o diabo tinha vencido.”
...e assim, perdivagando nesses pensamentos endemoniados acabei dormindo e o dia se esvaiu assim meio perdido aturdido no centro daquele ciclope daquele som de cabeças sendo cortadas pauleira desdentando bocas e esfacelando crânios e eu a pensar meu deus que poderá ainda vir meu deus meu deus por que tanta doideira numa só tacada será que você já está antecipando o fim eu penava e lembrava o inferno de signos de Pasolini se bem que era muito mais amador e cheio de humor do que esse: esse som( não música, som) ensurdecedor, é foda agüentar esta zuera,mano! E assim eu acabei caindo num sono meio azucrinado sonhando pesadelos acordado viajando nas ondas do inferno e vendo os diabinhos gargalhando lá no fundo do quadro. Perdivagava assim vagabundo na vagazona do entrevigília e sonho e de repente acordei...já não era mais quele dia tinha passado a noite e já era outro dia e já era a manhã do segundo dia... e eu abri a janela, desconfiado, descerrei a persiana devagar como quem não quer nada como caramujo saindo do caracol para se esbaldar na luz do sol e e não houv-ia mais aquela coisa aqueles baticuns aqueles tuntistuntunnnn malditos...ah, havia um solindo lá fora e ...nem entendi ou não acreditava: havia vivaldis sinfônicos voando no ar, eram a primavera o verão o outono e o inverno todos juntos em doces sons que se amalga-amavam nos ouvidos antes surdos- beethoveeeeeens vindos nas asas de abelhas que zumbiam nonas e quintas e maravilhas de Mozart navegando os ares que eram assim meio gelatinosos meio gosmentos de tanta música a pairar parar no ar eu até via eles lá os quatro cavaleiros empunhando rocks dos sessenta
e...ei, será que tomei alguma coisa ontem pra dormir e me ficou essa ressaca essa doideira me fazendo ver o que não é?
.mas não, o diabo não havia vencido e o inferno não era aqui, e agora...ainda havia espaços abertos e flores flores e florestas se abrindo...pensei nos lilazes e nas luzes nas margaridas brancas, sabe aquelas de árvore tipo os ipês aquele escândalo de beleza que até doem nos olhos pensei naqueles velhos interiores e nas pessoas gentes que nem sabem que existem essa música e essas noites e esses desvarios e esses vazios e esses vícios.. pensei nos passarinhos, sim nos passarinhos e no mato e no verde e...
e sei que o diabo não venceu a parada... muitos tamos noutra, ainda, e o mundo ainda tem redenção!
Cunhadão
não sei se gostei mais do seu texto ou do desenho do Rafa. Não q uma coisa possa mesmo ser comparada á outra. Não pode. Mas gostei tanto dos dois q até parece q dá pra comparar....
Bom demais...
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