quarta-feira, outubro 23, 2013

tá difícil, cara. quando esse sol mais quente que sua cama não deixa você dormir. tá foda ficar pensando em um tanto de coisa que você não queria. e ficar puta com tanta gente falando merda e sabendo que ninguém vai te entender. tá foda saber que ninguém percebe que você só quer poder ficar com a cabeça quase vazia, sem pensar nessa vida com tanta desgraça alheia. que você só quer poder olhar as coisas de um jeito mais otimista, mas quando você sai de casa  vê um cachorro todo ferido tentando achar algo pra comer ou beber, que mesmo assim abana o rabo quando você passa e te segue pra nenhum lugar. que na esquina tem um  bêbado de ontem dizendo que o mundo já acabou só que ninguém percebeu. você quer ser otimista e sente que não pode sonhar mais. e sente que não acredita mais em quase nada. aí faz força pra seguir e pensar que a vida é essa coisa assim meio esquisita, meio sacana, mas que tem muitas coisas boas. que você pode ainda esperar a chuva e deixar que ela limpe um pouco a cidade e a sua alma. que tem amigos. que tem um amor que talvez possa tá te esperando em algum lugar.

quinta-feira, outubro 17, 2013

depois de toda essa discussão sobre biografia autorizada ou não, chego à conclusão de que muita gente simplesmente esquece o que esses caras fizeram, esquece sua arte, seu talento e a enorme contribuição que deram pro país. sou contra biografia autorizada, censura prévia, acho que perde a força, fica capenga, unilateral, mas, mesmo com a antipatia e desconfiança que tenho pela paula lavigne , acho que caras como chico, caetano, gil, milton e outros têm o direito de se posicionarem . isso decepciona muitos, isso me decepciona, mas não pode, definitivamente, fazer que toda arte e história deles sejam jogadas no lixo, que eles sejam fuzilados no paredão da ignorância. os velhos gagás(como muitos os chamam) são parte de uma história que não podemos esquecer nunca. e vou continuar a ouvir e gostar de chico até morrer e quando ele diz que é contra alguma coisa, no mínimo, temos que pensar sobre.

sábado, outubro 12, 2013

você acorda e pensa num modo mais fácil de não pensar que o dia poderá ser uma merda. você acorda e não quer esse frio invadindo o seu corpo nem esse sol feio nesse céu indefinido de quase chuva. olha pro lado, faz um café, dá uma ajeitada na casa, põe água e comida pros gatos, come uma fruta. fuma o primeiro cigarro. ouve a primeira música. liga o computador e não tem nada de muito novo. quando percebe, tá na hora do almoço e nenhuma fome, mas você tem que comer. você tem que sair e fazer as coisas na rua. tem que trabalhar, fazer sacolão, conversar um pouco com o vizinho. tem que saber da mãe, dos irmãos, dos filhos. tem que se inteirar das notícias do mundo e pensar que o mundo é isso. não se incomodar com a evangélica moralista pseudoambientalistahonesta que se une aos ruralistas, nem com o ódio da mídia conservadora e muito menos com o assalto que acabou de acontecer na esquina. tem que esquecer da briga com sua amiga, da desesperança na educação, da noite que escapou por entre os dedos. você olha e vê a vida quase como uma repetição. você pensa e quase não vê sentido nessa coisa toda. aí, de repente, pensa nos amigos distantes, na cerveja gelada, naquele dia na praia, lê alguns versos de seu poeta preferido, vê a planta na área que cresceu muito da noite pro dia e o seu gato esticado com a barriga pra cima tentando driblar o tédio. lembra dos filhos e de como são bacanas e bonitos. você entra no banho e a água e o sabonete parecem limpar sua alma. o dia pode não ser mais uma merda. e ainda tem a noite.

(republicado com pequenas alterações)

segunda-feira, outubro 07, 2013

anjo caído

arte: rafael godoy

Ele entrou e disse que estava frio lá fora. Bebeu o café quase frio e acendeu um cigarro. Disse que aquele dia tinha visto algumas pessoas estranhas que o seguiam. Jurou que não era paranoia. Perguntou sobre os gatos e se esticou no sofá. Falou sobre o possível apocalipse mas disse que não acreditava em anjos. Elogiou a música que tocava, acho que Coltrane, e falou que nesse momento vinha uma paz quase inevitável ou que a vida tinha algum sentido. Pediu pra eu soltar os cabelos e sentir o cheiro do xampu que gostava. E ainda, com voz baixa e com os braços fortes, me puxou para o seu lado e me deu um beijo longo e forte. Sua boca tinha gosto de menta, provavelmente, alguma bala ou chiclete para tirar o gosto do cigarro. Estava intensamente sensual, com os cabelos despenteados e cheiro de chuva. Dormi em seus braços e quando acordei já tinha ido embora. Ele era assim, aparecia em qualquer hora, dizia coisas sem sentido ou ficava preso em seu silêncio. Eu entendia esse homem de poucas palavras e gestos definitivos. E ele sabia disso. Talvez fosse ele um anjo caído por acaso em minha vida.

( republicado, a falta de inspiração continua )





sexta-feira, outubro 04, 2013

quando a escuridão




a luciano fraga
arte: carcarah

quando a escuridão parece mais escura que é
e você está no meio do mar em um pequeno bote
vê uma mancha preta maior que a escuridão
pensa que não haverá mais jeito
desta vez não tem saída
então olha para cima e não vê estrelas
olha para baixo as águas são geladas e negras
você ali no pequeno bote
no meio daquele oceano imenso e gelado
sem tempo sem brisa sem cor sem som
e aparecem uns olhos esverdeados
que brilham e não são estrelas
são maiores que a escuridão e o frio
e você se agarra a eles a seu brilho
você acorda em sua cama e uns olhos verdes escuros
mais escuros que aquelas águas te olham
então você dorme e quase sonha quase se esquece
e quase pensa que está salvo