segunda-feira, junho 15, 2009

por ali

( estudo para aquarela/ paisagem/ rafael godoy)

caminhei por ali onde um amigo dos mais queridos
acabava de ser enterrado e o céu estava nublado
um vento frio entrava nas frestas da roupa

fiquei assim olhando aquele lugar cheio de árvores e um lago quase azul
e olhei os nomes de quem já estava debaixo da terra úmida
e pensei em cada nome que li e nas pessoas que poderiam ter sido

olhei a terra mexida e cheia de flores em cima do cimento
e sabia que ele estava ali com o corpo frio
e não queria pensar nele ali debaixo da terra

me lembrei de quando viajamos
das cervejas que tomamos e das músicas que cantamos
dos lugares e das pessoas
de como era bom estar do seu lado mesmo em silêncio
nos risos cúmplices e nos momentos de raiva
de como implicava comigo quando eu derrubava alguma coisa
ou quando lambuzava minha boca e minha mão de manteiga
ou trocava as palavras de um jeito distraído
e quando ele fazia palhaçadas e ria de si mesmo e do mundo

me lembrei de sua família perdida sem sua presença
dos filhos sem pai e do fogão a lenha

me lembrei de uma vida inteira com sua voz sua música sua dança
de um dia quando saímos de manhã e voltamos só de madrugada
e das longas conversas sobre a vida essa mesma vida que ele perdeu
e de deus de sentidos de indagações de confidências de perplexidades

caminhei por ali e pensei que ele estava debaixo da terra
e não queria pensar nisso
já era noite e os faróis dos carros brilhavam
no céu nublado somente uma estrela
e na terra um cheiro de flores

( O Vu se foi dia 10/06/2009)

42 comentários:

Renata de Aragão Lopes disse...

Mais que de poesia.
Você falou de saudade...

A melhor imagem, realmente, não é aquela sugerida pela terra remexida - ainda que dela emane o perfume de flores.

A melhor imagem é a da estrela, reluzente e única, em um céu mesmo nublado.

Grande abraço pra você, Adriana! Que suas ternas lembranças prevaleçam sobre qualquer outro pensamento.

Adriana Godoy disse...

Oi, Renata. É uma maneira de expressar algum sentimento que não sei como lidar. Foi essa semana que ele se foi. Ainda estou doída e triste. Obrigada pela leitura e comentário tão especial. Beijo.

Unknown disse...

Comovente, Adriana!

Sinto muito pelo seu amigo. Amigos são raros, e nós que escolhemos.
São pessoas especiais que muitas vezes superam a família.

E a gente pensa exatamente como você descreveu. Lembro que quando minha mãe morreu, algunas dias depois, choveu muito, e meu primeiro pensamento foi: "Meu Deus, mamãe está na chuva".

Frações de segundo que a memória desliza.

Seu texto é real e você observou o melhor: o perfume e as estrelas.

Realmente não há palavras!

Beijos e um abraço apertado.

Mirse

Luciano Fraga disse...

Amiga Adriana, antes, minha solidariedade e partilha com sua dor.Muito difícil, principalmente para nós ocidentais, lidar com as perdas e sobretudo com a morte, principalmente quando envolve alguém querido, conheço um pouco disso também e como é cruel.Não existe nenhuma fórmula para a superação, trata-se de algo muito pessoal.Sua homenagem bela e emocionante pode ser um caminho para amenizar a saudade e a falta, beijo terno.

Adriana Godoy disse...

Mirse e Luciano, saibam que com suas palavras fico mais serena. Saber que os amigos,mesmo à distância, se solidarizam comigo nesse momento é muito importante. Agradeço mesmo, de coração. Um beijo em cada um.

PS: Luciano, " por que vocês não sabem do lixo ocidental...", é isso. Beijo.

Renata de Aragão Lopes disse...

Voltei. Para reler.
Vai que cada leitura nossa
ameniza sua tristeza?...

E, de imediato, reparei
que mudou o título do poema!
Fez bem...
Bem melhor "por ali".

Um abraço carinhoso!

tania não desista disse...

sinto muito,adriana!imagino...alguém ...bem importante pra você. escrever...sobre ele, nesse momento,é como presenteá-lo com suas emoções e carinho.senti algo diferente ao ler ,e tristeza,
ao sabe-lo ,real e recente.
a linda aquarela...completa sua homenagem.
um carinhoso beijo
taniamariza

Bernardo Sampaio disse...

Muito sincero mesmo e bonito, cada imagem bem real, de um sentimento real. Uma tristeza carinhosa, de afago e saudade. Enfim, muito bom mesmo.

Anita Mendes disse...

"olhei a terra mexida e cheia de flores em cima do cimento
e sabia que ele estava ali com o corpo frio
e não queria pensar nele ali debaixo da terra"

essa parte do poema me tocou muito pois é assim que lembramos dos que não estão mais conosco.
muito triste uma perda mas como disse Neruda:
"Amo lo tenaz que aun sobrevive em mis ojos" .
eu acho que é por ai... não sei bem o que dizer numa hora dessas pq nada consola uma perda : a dor é individual .
o poema é catarse pura,
muito lindo e triste ao mesmo tempo ...
creio que ele ficaria feliz de saber a marca que ele deixou em vc.
Beijos pra ti,drika
Anita.

Devir disse...

Fico mal
ainda ontem comentava
inocente
lira latejante
hoje não
poema em febre
nenhum, nada
por enquanto
quero apenas
para Ele aqui
fazer silêncio

Meus sentimentos, Adriana Godoy

Adriana Godoy disse...

Renata,
Tânia,
Bernardo,
Anita,
Devir,
só posso agradecer tanto carinho. Isso realmente faz muito bem . Beijo em cada um.

Adriana Godoy disse...

Devir, tem um comentário em "Lobos" sobre o seu.

sopro, vento, ventania disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
sopro, vento, ventania disse...

Adriana, que o seu coração consiga conviver com a saudade que nunca acaba, mas que dá o conforto de saber que vivemos algo muito importante e inesquecível.
Um beijo carinhoso e obrigada pelo retorno.
Cynthia

nina rizzi disse...

oi, dri,

sinto muito pelo teu amigo. e como vc, nao gosto de pensar que as pessoas estão debaixo da terra. elas estão debaixo de cada parte de nós. de cada pedaço de saudade e memória.

e também esses rituais são mórbidos demais. eu não quero velório, caixão e terra. eu quero vídeos com meus risos, e meu blogue e meus cadernos e as lembranças disso tudo. não de alguém sem-vida e terra. ninguém merece uma lembrança assim.

e o seu amigo, onde estiver, se existe uma alma pr'além isso aqui, não sei, mas caso exista e ele te veja e leia. ele fica feliz de re-viver cada momento com-partilhado e VIVIDO contigo. fica feliz porque vc o vê, muito mais que pó.

beijo. te amo :)
e hoje jogo duas flores no mar ;)

Fred Matos disse...

Embora tenha partido, seu amigo está vivo nos seus versos.
Beijos

Cristiane Felipe disse...

Dri, embora seja dor profunda, faz parte dessa nossa estadia por aqui...
Sobre o que você me disse, não se preocupe de maneira alguma, eu te entendi plenamente. É bom compartilhar esses sentimentos. Mando pra você toda a força possível e fico aqui torcendo pelos que têm chance. Obrigada. Beijo grande

Daufen Bach disse...

Olá Adriana,
aqui lendo-te.
que bela e triste canção poética,
canção de saudade. Saudade é uma coisa boa de sentir, ruim qdo é apenas lembrançaa, mas saudade é bom. Li um psicanalista que dizia que o unico momento que nos igualamos é este, todos despidos, todos desnudos...num mesmo estado de comoção e, ele, também dizia que nestes momentos é hora de sorrir, lembrar as coisas boas e sentir intensamente a vida.

bom falando demais... te dou um cigarro e me dá uma cerveja. vamos compor.

abraço a ti.

José Carlos Brandão disse...

Adriana, estou chegando de viagem. Com saudades da sua voz - um pooeta é a sua voz, só se é poeta quando se descobre a sua voz, com o que ela tem de próprio, de inconfundível. É essa voz que vejo falando enternecida do amigo morto. Morremos um pouco com os amigos que se vão, sentimos que o tempo passa e já não somos os mesmos quando começamos a contar os mortos. Contamos os mortos por somos enterrados com eles, ficamos menores, com menos peso, menos substância.

Um abraço amigo.

~*Rebeca*~ disse...

Adriana,

É difícil lidar com perdas. Faz mais de 1 ano que perdi minha mãe... sabe, a vida é essa. É a vida tirando nosso sorriso de um lado e nós com o clareamento total no sorriso da alma.

Paz no seu coração, menina linda.

Rebeca

-

Adriana Godoy disse...

Oi, gente!! É muito bom receber tanto carinho através de suas palavras. Ontem foi a missa, muita tristeza e choro, um reviver do velório. Mas, saímos de lá e fomos tomar umas em um bar perto da casa dele. Muitas lágrimas, muitos risos, muitas histórias, muitas lembranças. Enfim, uma forma de reinventar a vida e continuar. Mais uma vez, obrigada a cada um de vocês. Beijo.

Marcia Barbieri disse...

Lindo o poema e ainda bem que as histórias permaneceram aqui, em cima da terra.

beijos ternos

Vinícius Paes disse...

Emocionante Adriana, esse seu dom de chorar sorrindo com as palavras. Assim é a vida, e gênios aqueles que como ti sabem lidar com as diferentes emoções que compõe e dão alguma forma e sentido (abstrato) pra ela.

Um lindo texto

Beijo.

BAR DO BARDO disse...

enternecido o canto para aquele que foi primeiro... sente-se como um próximo, um amigo, um irmão.

é uma dor camuflada pela poesia.

mas, continua sendo dor.

ainda bem que você sabe cantar, dri.

obrigado.

Isabel Estercita Lew disse...

Oi Adri, é muito triste perder um amigo, mas quando isso acontece a gente lembra as coisas boas, trazemos dele o melhor, não vale a pena olhar para a terra mexida.
Mas você o viu em uma estrela única no céu e sentiu cheiro de flores.

Belo e triste poema, maravilhosa a aquarela de teu filho

Beijos

Estercita

guru martins disse...

...morrer
é a maior das
imbecilidades
que a vida
nos impõe.
Nada mais
"esdrúxulo"
como a feiúra
da pronuncia
dessa palavra...

bj

Beatriz disse...

E na terra um cheiro de flores e minha identificação com vc. Sempre que lembro dos meus mortos penso neles embaixo da terra. Quando chove lembro e fico triste. Sinto-os tão sozinhos qdo na verdade a solidão é a minha;)
Pra dizer que seus poemas sempre me comovem

Adriana Godoy disse...

A vocês que ainda não agradeci, obrigadíssima. Mais uma vez reforço que é muito bom esse carinho. Beijo grande.

Guru, também acho.

Talita Prates disse...

Essa dor, certa.
Falas da única certeza que todos nós temos.
A finitude.
Obrigada pela visita.
Bjo e paz.

~*Rebeca*~ disse...

Isso é a história descarada de duas criaturas loucas.

Até mais.

Jota Cê

Rafael R. V. Silva. disse...

dificil não me emocionar com suas palavras. você me trouxe saudosas lembranças. ou não. elas já estavam aqui do meu lado, saudade fica sempre grudada no ouvido sussurando bobagens e a gente não sabe se ri ou se chora.

beijão.

Barone disse...

Amizade travestida de poesia.

Adriana Riess Karnal disse...

Há flores em cima da terra,mas embaixo só tristeza. Espero que lembres sempre do teu amigo com carinho...o mesmo que demonstras na poesia...bela descrição dos momentos que tiveram.

Unknown disse...

A mesma sensação tenho em relação à Sandrinha, uma amiga que partiu para o outro Plano ao final do ano passado. Mesmo sendo uma amiga virtual, a dor foi imensa, mas, depois compreendi que ela apenas mudou de casa e continua, ainda, a existir.

Meus pêsames, Adriana.

Lou Vilela disse...

Sinto muito por sua perda! - Bela e comovente forma de externar sua dor.

Abraços,
Lou

Anônimo disse...

Dri,
a cada dia mais admiro o que você escreve, cê não pensa em lançar um livro não? Acho que você e a Lu podiam começar a pensar em participar de uns eventos, talç como a Aninha, quem sabe? Ô, pensa aí, ô!
Beijos
Andrea

Adriana Godoy disse...

Obrigada mais uma vez a vocês que compartilharam esse momento tão especial e transmitiram tanto carinho. Beijos.

~*Rebeca*~ disse...

Adriana,

Espero que esteja melhor, viu? A vida continua e ser feliz é a regra.

Beijo grande, menina linda.

Rebeca

-

Úrsula Avner disse...

Oi Adriana, seu texto é muito bom e seu cantinho uma delícia. Bjs.

Assis de Mello disse...

Oi Adriana,
Vc sempre atenta às postagens novas, obrigado pelo comentário lá no meu blog.
Olha, esse seu poema me tocou demais. É muito lindo.
A dor é muito triste pra quem fica. Mas ele está experimentando a suprema liberdade... voltando ao útero da grande mãe.
Um beijo,
Chico

vieira calado disse...

Bem bonito,

esteve poema quase em forma

de reportagem.


Beijinhos

Pancho Ramirez disse...

¿soy el Gran Macho o solo una Damita? Solo lo sabrás entrando en mi blog, mimosona ardiente. Y si entras, prepara tu gladiolo picarona, higienízalo debidamente que pronto será visitado, humedecido y satisfecho por el Adonis de Plutón, osease YO, el gran Monotributo.
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