terça-feira, outubro 17, 2006

filhos na noite

irmãos na noite espalhados
na casa da velha mãe
hoje não é festa, não é aniversário
e surge a pergunta mortal
quem vai ficar com ela?

como se ela não pensasse
como se ela fosse a carga mais pesada

a mãe poderosa e infalível
mergulha nas suas sombras
nos seus medos e sofre

por que meus filhos estão aqui?
queria afagá-los e tirar deles todo sofrimento
queria carregá-los no colo
queria alimentá-los e enchê-los de alegria

os filhos como morcegos agitados
começam a se debater
quem vai ficar com ela, a mãe?

uns esbarram as asas frágeis nos outros
uns tentam perfurar o coração dos outros
uns se acham insubstituíveis, infalíveis
são líderes, poderosos, ou mais sábios
outros apenas ouvem calados o que se fala

e no fundo do corredor, em seu quarto,
a mãe adormece, preocupada com suas crias

o cansaço da vida faz doer o seu corpo
as suas pernas são quase inúteis
e no seu peito o coração metálico
marca os seus passos dia a dia

e nessa noite ela sonha
sonha com a família em volta da mesa
as conversas intermináveis,
os risos, as piadas, as brigas, a comilança
seus filhos não cresceram tanto
e o seu velho companheiro ainda esta lá

nessa noite, ela sonha

os morcegos, suas crias, levantam voo
cada um com a sua culpa, cada um com o seu pecado

imaginam que poderiam cantar uma canção
que embalasse o sono de sua mãe
essa mulher que tanto sugam, que tanto amam
que tanta admiração e espanto causa
que guarda tantos segredos

mas não sabem como
e choram
suas asas pesam
como se carregassem a humanidade inteira
como se já estivessem definitivamente
presos em suas cavernas mais escuras

5 comentários:

Anônimo disse...

Dri, escreva essas coisas sim, fazem parte de nós querendo ou não, faz chorar sim, mas é o peso de cada filho morcego que carregamos e o não saber o que fazer com eles quando voamos.. E vamos, né
Bjs
Andrea

Anônimo disse...

Nunca tive essa pergunta, a resposta era 99,99% das vezes, eu mesma...
Agora que já não tem porque a pergunta, me pergunto se não deveria ter respondido mais:
SOU EU, SOU EU e me pergunto se não teria valido muito mais a pena...porque enquanto tive que responder, sempre e sempre VALEU.
Enquanto eles estão conosco não sabemos dar a importãncia que eles podem ter, quando os perdemos, ficamos como moscas, abelhas (depende da casa, tá) voando em torno de uma luz que já não conseguimos alcançar...
E aí ... eles já foram... só nos resta chorar e tentar entender a grandeza de tê-los junto a nós, conosco, partilhando esse caminho, que não é mais o deles, mas, que sem eles é muito mais difícil, sem dúvida.
Bjs Dri,
torcendo pra você estar lá no PA vendo "ele", né?
Bjão

Anônimo disse...

Cunhadão,
qd li este texto, tempos atras, não tinha compreendido a "dimensão" dele. Sabia, do encontro dos filhos, sabia da solução encontrada, mas caho q ñ quis sentir o q tudo isso significava pra vcs...acho q estava tão envolvida com o meu prórpio sofrimento q acabei desconsiderando o seus. De qq maneira, q lindo este texto... ele reflete muito mais do q o momento seus e da sua mãe. Com certeza, ele é a descrição exata do q a maioria das pessoas vivem e ñ conseguem externar.

Anônimo disse...

Saudades de mamma... Gostei muito.

Anônimo disse...

Isso é maravilhoso. Tão estranho, tão familiar.......Você é uma pérola