Ele entrou e disse que estava frio lá fora. Bebeu o café quase frio e acendeu um cigarro. Disse que aquele dia tinha visto algumas pessoas que o seguiam. Jurou que não era paranoia. Perguntou sobre os gatos e se esticou no sofá. Falou sobre o possível apocalipse, mas disse que não acreditava em anjos. Elogiou a música que tocava, acho que Coltrane, e falou que nesse momento vinha uma paz quase inevitável ou que a vida tinha algum sentido. Pediu pra eu soltar os cabelos pra sentir o cheiro do xampu. E ainda, com voz baixa e com os braços fortes, me puxou para o seu lado e me deu um longo beijo. Sua boca tinha gosto de menta, provavelmente, alguma bala para tirar o gosto do cigarro. Estava intensamente sensual, com os cabelos despenteados e cheiro de chuva. Dormi em seus braços e quando acordei já tinha ido embora. Ele era assim, aparecia em qualquer hora, dizia coisas sem sentido ou ficava preso em seu silêncio. Eu entendia esse homem de poucas palavras e gestos definitivos. E ele sabia disso. Talvez fosse ele um anjo caído por acaso em minha vida.
arte: rafael godoy
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