arte: rafael godoy
Busco
compreender algumas coisas em mim, mas isso também passa. Não estou
alegre, nem triste, nem nada. O telefone toca e é um convite, pode ser
bom. Não quero também. Tenho que me vestir, me arrumar, sair de casa ou
preparar a casa para alguém. Então dou uma desculpa qualquer e fujo de
qualquer compromisso. Gosto da casa assim, com a cama desfeita, mas
aconchegante. Com algumas coisas fora do lugar, que fui eu que deixei.
Os livros ali, assim jogados. Leio, mas não me prendo a nenhum. Um poema
aqui, outro lá. Trechos de obras já lidas. Às vezes um livro inteiro em
poucas horas. Mas é assim que gosto. Vejo tevê e procuro alguma coisa
que preste. É difícil, mas consigo. Também, se quiser, mudo o canal a
qualquer momento e brinco com as imagens. Ouço uma música que há muito
não escuto e me surpreendo: como eu gostava daquela música! E acho uma
merda. Durmo em alguns momentos e tenho sonhos estranhos, como ir ao
fundo de uma piscina funda, muito funda, cheia de folhas e lama e
conseguir voltar à superfície, ilesa. E quando volto à tevê, assisto a
uma cena semelhante. Só que o cara não teve a mesma sorte. Afogou-se.
Tocam o interfone. Pode ser o gás, o correio, alguém pedindo alguma coisa, ou mesmo, um amigo. Mas não atendo. Não quero sair dessa inércia. Parece que a chuva parou. E eu parada aqui e os gatos me olham.
Tocam o interfone. Pode ser o gás, o correio, alguém pedindo alguma coisa, ou mesmo, um amigo. Mas não atendo. Não quero sair dessa inércia. Parece que a chuva parou. E eu parada aqui e os gatos me olham.
(republicado)
11 comentários:
Eu adorei o texto, Godoy.
Você tem o dom de descrever estes estados/vivências comuns a muitos. Suas cenas levam-nos a uma imediata identificação.
Excelente!
Beijos,
H.F.
Umtexto bem com a cara do dia de hoje, Adrina. Deveria ser triste, deveria ser depressivo, mas fica no ar um ar leve (nem essa redundância ar-ar tem importância). É, também estou sem votade nenhuma. Isso é ruim e isso é bom.
Beijo.
A vida fica nublada.
Cinza.
A inércia agradável.
Como é bom gostar de não gostar de nada. Nem de ninguém.
chuva, gatos, inércia: a existência esférica
beijo
HF, bom que gostou, beijo;
JC, gostei de sua percepção. Beijo
JC, gostei de sua percepção. Beijo
Nilson, a inércia agradável..boa! beijo
Assis, é isso! Beijo
Adriana, belo, sensível esse texto. Chuva fininha, casa com solidão... Beijo.
Oi, poeta! De vez em quando é bom mesmo! Beijo
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